As vantagens e as desvantagens dos materiais auxiliares no ensino da natação
Tiago Barbosa

BARBOSA, T. (2004). Ensino da Natação - Vantagens e desvantagens da utilização dos materiais auxiliares na adaptação ao meio aquático.  Conferência apresentada no 27º Congresso Técnico-Científico da Associação Portuguesa de Técnicos de Natação. Lisboa.

 

1. INTRODUÇÃO

Um dos temas que mais controvérsia ou discussão gera, quando se fala no ensino da natação é o da relevância pedagógica dos materiais auxiliares.

De acordo com alguns autores, a utilização dos materiais, com especial ênfase para aqueles que auxiliam à flutuação, serão de todo de evitar. Aliás, para alguns deles, mais radicais, a utilização desses materiais será condenável (Catteau e Garrof, 1988). Atrasam o processo de consciencialização da impulsão e da flutuabilidade (Catteau e Garrof, 1988). Assim, estes autores sugerem um ensino onde o aluno desde o início deverá procurar resolver por si mesmo os problemas fundamentais do equilíbrio.

Uma outra corrente defende a utilização dos materiais auxiliares (Langendorfer e Bruya, 1995; Navarro, 1995; Moreno e Sanmartín, 1998; Barbosa e Queirós, 2000). Com a ressalva de que a sua utilização excessiva e abusiva criará nos alunos dependências, tornando mais complexo, posteriormente, o processo da sua abolição (Navarro, 1995; Barbosa e Queirós, 2000).

Assim, é objectivo desta comunicação apresentar as principais vantagens e desvantagens da utilização de materiais auxiliares no processo de adaptação ao meio aquático.

 

2. VANTAGENS DO USO DOS MATERIAIS AUXILIARES

Os autores que defendem a utilização dos materiais auxiliares, no processo de adaptação ao meio aquático, apresentaram diversos argumentos, sustentando as suas opiniões. Navarro (1995) elenca algumas vantagens para a utilização dos ditos materiais: (i) aumenta a sensação de segurança do aluno; (ii) o aluno fatiga-se menos, logo, a densidade motora ou a duração da aula poderá ser superior; (iii) o ensino é mais atractivo para o aluno e; (iv) os alunos aprendem a realizar um maior número de habilidades num menor período de tempo.

Moreno e Sanmartín (1998) acrescentam mais algumas vantagens. A utilização dos materiais auxiliares enriquece o desenvolvimento físico e perceptivo-motor dos alunos. Depois, também permite diversificar as vivências e as experiências no meio aquático. Portanto, permite adquirir importantes habilidades motoras e experiências no meio aquático. Todavia, revelam-se bastante cépticos no que concerne à escolha de materiais mais convencionais, como as placas ou os pull-buoys. Segundo os autores, estes materiais, interferem com os objectivos pedagógicos e potenciam o acidente. Antes, sugerem o uso de materiais recreativos, como os arcos, as bolas, os tapetes flutuantes ou os escorregas, entre outros.

Em síntese, a aquisição da prontidão aquática decorre da interacção entre o aluno, a tarefa a realizar e o envolvimento (Langendorfer e Bruya, 1995). A utilização de diferentes tipos de materiais auxiliares consubstancia uma forma de alterar o contexto onde a tarefa é executada, diversificando as experiências vividas no meio aquático. Neste quadro, os materiais auxiliares, serão um contributo positivo para atingir o já referido estado de prontidão aquática (Johnston et al., 1994).

 

3. TIPOS DE MATERIAIS

Diversos autores apresentaram classificações para os diferentes tipos de materiais auxiliares que é possível utilizar no ensino da natação. Navarro (1995) centra a sua atenção nos materiais auxiliares da flutuação. Sebastiani e González (2000) distinguem os materiais em convencionais (para a prática das actividades aquáticas), em materiais não convencionais e em materiais recreativos. Estes últimos são decompostos em materiais de pequeno porte e de grande porte.

Moreno e Sanmartín (1998) também classifica os materiais como sendo de grande porte e de pequeno porte. Os materiais de grande porte incluem os insufláveis e os equipamentos fixos, como por exemplo, os escorregas. Os materiais de pequeno porte dividem-se em materiais convencionais, em materiais não convencionais, em materiais lúdicos e em materiais adaptados (ou criados pelo professor).

Por sua vez Langendorfer e Bruya (1995) dividem os materiais em pequeno e grande porte. Os materiais de pequeno porte incluem materiais auxiliares da flutuação, materiais auxiliares da propulsão e em objectos lúdicos.

Uma outra forma de classificar os materiais é de acordo com o principal objectivo a que se destina. Ou seja, com a principal habilidade motora aquática básica que auxilia a executar e/ou a realizar. Todavia, há que realçar que qualquer material poderá atingir mais de um objectivo (Navarro, 1995; Moreno e Sanmartín, 1998; Sabastiani e González, 2000). Isso só será possível se ele não colocar em causa a segurança do aluno e, obviamente, atingir o propósito desejado do ponto de vista pedagógico.     

Pelo que foi dito parece ser mais adequada uma classificação dos materiais de acordo com a sua principal função do que com base na sua dimensão, dada a subjectividade que este critério acarreta. Assim, são considerados os materiais que auxiliem à execução das habilidades motoras aquáticas básicas “equilíbrio”, “respiração” e “propulsão”, bem como, os materiais recreativos e os materiais adaptados.

 

3.1. MATERIAIS AUXILIARES DO EQUILÍBRIO/FLUTUAÇÃO

São materiais cujo o principal objectivo é auxiliar o aluno a atingir uma dada posição de equilíbrio (vertical ou horizontal) e, desde logo, aumentar a sua flutuabilidade. Para tal propósito são usualmente produzidos em materiais pouco densos mas resistentes. Enquanto materiais auxiliares do equilíbrio/flutuação encontram-se as placas, os pull-buoys, as braçadeiras, os fatos de banho com locais para colocar materiais flutuantes ou, os cintos de materiais flutuantes.

Praticamente não se conhecem publicados na literatura estudos empíricos sobre as (des)vantagens do uso de materiais auxiliares de equilíbrio/flutuação no ensino da natação. Num desses raros estudos, Erbaguh (1986 in Langendorfer, 1987) verificou que se atinge primeiro o equilíbrio horizontal quando se usa materiais auxiliares do que sem a sua adopção.

 

3.2. MATERIAIS AUXILIARES DA PROPULSÃO

São materiais com o principal objectivo de facilitar a propulsão do aluno no meio aquático. Estes equipamentos procuram aumentar a área propulsiva, como por exemplo no casos das palas. Outros, também tentam aumentar a propulsão decorrente de escoamentos do tipo instável, como a barbatana que permite a rápida mudança de direcção no seu deslocamento vertical, facilitando a geração de vorticidade.

Existem diversos estudos sobre estes tipos de equipamentos no contexto de treino e de competição (a título ilustrativo, Mountail e Rouard, 1992; Rejman et al., 2003). Contudo, não se conhecem trabalhos sobre a sua relevância em fases anteriores, como seja a do ensino.

 

3.3. MATERIAIS AUXILIARES DA RESPIRAÇÃO/VISÃO

Existem materiais que procuram facilitar a utilização das funções “respiração” e “visão” no meio auqático. O tubo de respiração (snorkel), os óculos de natação, a mola para o nariz ou, a máscara de mergulho são parte integrante deste grupo de materiais.

Com os materiais que auxiliam a respiração, o aluno tem a possibilidade de ventilar livremente, não tendo necessidade de sincronizar a respiração com a acção dos segmentos propulsivos. Também não necessita de vencer a maior densidade da água, em comparação com a do ar, durante a expiração. Consequentemente, a expiração não necessita de ser activa e voluntária, podendo ser executada reflexa e passivamente, como ocorre no meio terrestre. Por sua vez, com a utilização dos materiais auxiliares da visão, os problemas associados à reduzida função deste sentido no meio aquático devido à refracção e à opacidade deixam de existir. É que a ausência de informação extroceptiva, tende a afectar o desempenho técnico do sujeito (Abrantes, 1982; Novák, 1983). Isto é, os indivíduos apresentam fortes constrangimentos à capacidade de se deslocar em linha recta, tendendo a desviar-se da trajectória desejada. Acresce-se que não sentem a massa de água a contactar directamente com a córnea, pelo menos de forma tão abundante, como se não os usasse.

 

3.4. MATERIAIS RECREATIVOS

São materiais eminentemente motivadores para as crianças realizarem determinadas tarefas ou para manterem-se durante mais tempo numa dada actividade. Serão exemples de materiais desta categoria os tapetes flutuantes, as barras de imersão, as bolas, os baldes, etc.

Estes materiais, à partida, apresentam duas vantagens (Langenforder, 1987). Encorajam o aluno a interagir com a água, especialmente em fases iniciais de adaptação ao meio aquático. Também servem como “distracção” ao medo ou à relutância que o aluno tenha a este meio, novamente, nas fases iniciais da adaptação.

Alguns estudos revelaram o interesse pedagógico que estes tipos de materiais tem na adaptação ao meio aquático (Langendorfer, 1987; Johnston et al., 1994). Daí que tenham surgido uma corrente apologista da utilização privilegiada destes materiais nas fases iniciais da adaptação ao meio aquático (Johnston et al., 1994; Langendorfer e Bruya, 1995).

 

3.5. MATERIAIS ADAPTADOS

Consideram-se enquanto materiais adaptados todos aqueles que não são produzidos em série e com o propósito específico de serem utilizados em contextos aquáticos.

São materiais construídos ou adaptados pelo professor, ou por terceiros, com fins recreativos ou de auxiliar a execução de uma determinada habilidade motora aquática básica. A título ilustrativo pode-se referir a criação de um material auxiliar da flutuação com garrafas de plástico vazias ou, de um cesto de basquetebol com materiais reciclados.

 

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. ABRANTES, J. (1982). Informação extroceptiva em natação. In: P. Sarmento, C. Carvalho, I. Florindo e A. Vasconcelos Raposo (eds.). Aprendizagem Motora e Natação. pp. 47-66. Edições do Instituto Superior de Educação Física da Universidade Técnica de Lisboa. Lisboa.

2. CATTEAU, R. e GAROFF, G. (1988). O ensino da Natação. Editora Manole. São Paulo

3. BARBOSA, T. e QUEIRÓS, T. (2000). Manual prático de Actividades Aquáticas e Hidroginástica. Ed. Xistarca. Lisboa.

4. JOHNSTRON, K.; BRUYA, L. e LANGENDORFER, S. (1994). Ready to paddle. Parks & Recreation. (feb): 50-56.

5. LANGENDORFER, S. (1987). Children's movement in the water: a developmental and environmetal perspective. Children's envioremental quertely. 4(2): 25-32.

6. LANGENDORFER, S. e BRUYA, L. (1995). Aquatic readiness. Developing water competence in young children. Human Kinetics. Champaign, Illinois.

7. MONTEIL, K. e ROUARD, A. (1992). Influence of the size of the paddles in front crawl stroke. In: D. MacLaren, T. Reilly e A. Lees (eds.). Biomechanics and Medicine in Swimming VI. pp. 99-104. E & FN SPON. London.

8. MORENO, J. e SANMARTÍN, M. (1998). Bases metodológicas para el aprendizaje de las actividades acuáticas educativas. INDE Publicaciones. Barcelona.

9. NAVARRO, F. (1995). Hacias el dominio de la Natación. Editorial Gymnos. Madrid.

10. NOVÁK, J. (1983). Swimming direction and visual control. In: P. Hollander, P. Huijing e G. de Groot (eds.). Biomechanics and medicine in swimming. pp. 345-349. Human Kinetics Publishers. Champaign, Illinois.

11. REJMAN, COLMAN, V.; SOONS, B. e PERSYN, U. (2003). A preliminary study of the kinematics and dynamics of single fin movement. In: J.C. Chatard (ed.). Biomechanics and Medicine in Swimming IX. pp. 511-515. University of Saint-Etienne. Saint-Etienne.

12. SEBASTIANI, E. e GONZÁLEZ, C. (2000). Actividades acuáticas recreativas. INDE Publicaciones. Barcelona.

 



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